entrevista por Guilherme Lage
Em 2022, quando as máscaras e o álcool gel puderam, finalmente, ser deixados de lado, a banda sueca Blues Pills pôde apresentar no palco a força visceral de seu então disco mais recente “Holy Moly”, lançado em agosto de 2020. Naquele tempo, apesar do retorno ao púlpito, as faixas já eram velhas conhecidas dos fãs. Catártico, o álbum trazia sensações como luto, ansiedade e até um pouco de raiva, sentimentos conhecidos por quem viu a vida mudar na pandemia.
Dois anos após estes shows, que contaram inclusive com uma passagem pelo Brasil (e uma conversa com o Scream & Yell), o Blues Pills volta bem-disposto e energizado com “Birthday” (2024), seu quarto disco, recém-lançado. De acordo com a própria banda, a obra nasceu de uma forma mais serena de lidar com a vida. Um exemplo é o single “Piggyback Ride”, que traz a vocalista Elin Larsson deixando bem claro: quero me divertir sob o céu escuro.
Antes de “Birthday” ser liberado ao mundo, quatro singles adiantaram o clima do material: a citada “Piggyback Ride” e também a faixa título mais “Don’t You Love It?” e “Top of The Sky”, músicas que justificam o sucesso do grupo de blues rock/classic rock-revival com os headbangers que erguem as mãos em chifres no ar durante os shows do grupo. Em entrevista para o Scream & Yell, Elin, acompanhada pelo guitarrista Zack Anderson e o baterista Andre Kvarnström contaram um bocado sobre como foi dar à luz o novo disco.
Ouvindo as primeiras faixas que vocês lançaram, me parece que a música em “Birthday” vem de um lugar mais sereno do que em “Holy Moly!”, talvez. Essa foi uma decisão consciente ou vocês só estavam mais felizes e se sentindo mais energizados dessa vez?
Zack: Acho que não foi uma decisão consciente, mas eu com certeza acho que você está certo, é uma dedução correta. Acho que (a serenidade) veio do que todos nós estávamos vivendo quando compusemos esse álbum, acho que todos estávamos em momentos muito melhores e todo mundo estava feliz e se sentindo bem. Foi extremamente divertido fazer o disco, não havia nenhum sentimento negativo naquele momento. Eu não diria que tudo estava ruim na época de “Holy Moly!”, mas havia muitas coisas acontecendo no momento e não estávamos tão em paz naquela época, com toda certeza.
O título “Birthday” soa bem festivo também, mesmo que vocês estejam dizendo que vão estragar o aniversário de alguém na primeira frase da música. Como a ideia para o título surgiu?
Elin: Por muito tempo nós não tínhamos um nome para o álbum, então estávamos pensando: como ele deveria se chamar? Não conseguíamos pensar em nada. Eventualmente, descobri que estava grávida, esperando meu filho, então meio que tudo se encaixou. Fizemos uma sessão de fotos com essa artista de Los Angeles, Trippy Dana, e eu estava grávida de 8 meses. Antes de eu descobrir que estava grávida, nós tínhamos gravado três músicas, então foi uma grande parte desse disco, especialmente para mim (risos). Então fez muito sentido chamá-lo de “Birthday”.
Eu adorei “Piggyback Ride”, acho que o riff é muito legal, assim como a batera e os vocais, que são incríveis. A letra também chamou minha atenção, acho que foi o Zack que disse que ele pensava que as pessoas iam gostar de andar de moto enquanto ouvem a música. É uma música bem hard rock, bem energética, era isso que vocês estavam tentando fazer mesmo quando escreveram a faixa?
Zack: Não acho que necessariamente tentamos fazer isso, mas quando terminamos a música, era meio que um sentimento que tínhamos. “Essa é uma música para andar de moto”. Acho que é uma canção um pouco experimental, porque é meio hard rock, mas ao mesmo tempo quando escrevemos a música, estávamos muito inspirados por Gorillaz, então tentamos dar esse tom quase que eletrônico ali. Há uma bateria eletrônica por baixo da gravação da bateria e também há um sintetizador no fim da música e essas coisas.
Elin: Também há os efeitos nos meus vocais.
Zack: Isso. Estávamos experimentando com outros sons que nunca tínhamos usado antes.
Andre: Foi uma música muito divertida de tocar e gravar, porque é meio diferente das outras coisas, há esse breakdown enorme no final, que é simplesmente muito divertido de tocar.
Algumas lembranças especiais para contar da passagem de vocês pelo Brasil em 2022?
Elin: Só memórias incríveis, foi muito incrível e muito especial também, porque as eleições presidenciais aconteceram no dia seguinte ao show, então você podia sentir a vibração na cidade, em São Paulo. Foi incrível, extremamente divertido!
Andre: Foi uma experiência totalmente positiva, com certeza.
Algo que sempre chama minha atenção quando ouço bandas suecas é que é meio difícil de apontar que tipo de música elas realmente estão fazendo. Há essa mistura muito louca de estilos em bandas como Hellacopters, Graveyard e vocês. Vocês são muito queridos por fãs de heavy metal, mas parece haver um pouco de punk aqui e ali, há mesmo esse background e influência punk?
Zack: Sim, acho que especialmente nos últimos álbuns nós começamos a deixar isso aparecer mais, porque no início nós estávamos tentando soar como bandas dos anos 1960 e 1970 e devagarzinho enquanto continuávamos com a banda, paramos de nos importar com isso e ainda temos aquelas influências, mas pelo menos para mim, eu cresci ouvindo bandas como The Hives e White Stripes que têm um toque retrô também, mas um pouco mais “punk-y”. E hoje em dia ainda mais, nós conseguimos ouvir bandas modernas. A Elin, por exemplo, sei que uma das bandas favoritas dela é o Turnstile.
Elin: É! E também tem essa banda incrível chamada High Vis, que é uma banda de hardcore do Reino Unido. Nós também tocamos no Hellfest e vimos todo o show do Madball (risos). Acho que você não deveria se limitar e ouvir todo o tipo de música diferente, porque isso é essencial. O show do Madball foi o melhor show do festival, pelo menos para mim.
Andre: Foi muito legal vê-los. Eu costumava tocar em bandas de punk rock e hardcore há uns 10 anos, entendo a energia. Punk e hardcore são muito rápidos, a energia é definitivamente muito importante nesses gêneros de música, é difícil saber o quanto isso afeta o Blues Pills. É uma coisa diferente, temos todos esses elementos que nós meio que misturamos e sua experiência musical toma forma e te torna o músico que você é, eu acho. É interessante que você ouve e nota isso.
E falando de metal, ter assinado com a Nuclear Blast deve ter ajudado bastante vocês a se conectar com o público de heavy metal, certo? Metalheads gostando da música de vocês.
Elin: Eles nos amam ou nos odeiam, não há meio termo (risos).
Zack: O lance com a cena de metal é que nós nunca tentamos ser parte da cena dela, meio que só aconteceu, porque a Nuclear Blast assinou com a gente e nós meio que fomos por esse caminho e eles nos abraçaram. Não foi nada planejado, nunca nos sentamos e conversamos: “a galera do metal vai adorar nossa música!” Por alguma razão muitos deles gostam, acho que é porque esse tipo de rock n’ roll vintage é meio que o estágio inicial do metal e por isso rolou.
Elin: Isso! Acho que foi exatamente isso.
Na América Latina e no Brasil mais especificamente, temos essa fascinação por bandas suecas. Por alguma razão, vocês nos cativam. Quando vieram aqui, vocês notaram isso? O público é muito apaixonado, cantam todas as músicas, foi algo que bateu em vocês logo de cara quando vieram?
Andre: Nossa, com certeza!
Elin: Sim, no show em São Paulo as pessoas estavam cantando mais alto do que eu! O lance é que nunca tínhamos tocado ao vivo no Brasil e a gente costuma mudar um pouco as músicas no show em relação ao disco. De vez em quando esqueço minhas letras e a galera cantando realmente me ajudou (risos). Eu errava e eles logo cantavam certo e eu voltava direitinho (risos). Também foi incrível ver tantas mulheres na plateia e na frente do palco, eu achei muito legal, porque normalmente não é assim que rola na Europa. Assim, há muitas meninas que vêm ao show, mas acho que em São Paulo, era meio que metade mulheres e metade homens no público, pelo menos era assim que soava (risos). Foi muito legal!
– Guilherme Lage (fb.com/lage.guilherme66) é jornalista e mora em Vila Velha, ES.